“A ponte serve de passagem por firmar-se contra extremos”.

Abrir a boca para falar em política, atualmente (e desde algum tempo) é comprar briga com o outro polo da plateia.

Sim, porque a plateia está polarizada e entorpecida como horda de zumbis. Ambas. Em ambos os polos.

Não há racionalidade a levar em conta. O raciocínio está embotado, apesar de todos pretenderem a “razão”.

Explico por que me refiro a “plateia”: é que os agentes ativos da política – os políticos de “profissão” – estão plenos de sua vontade e objetivos espúrios. Entre eles não há polarização, senão aquela necessária para manter a horda alimentada com o ódio e o desconhecimento, atordoada, a se digladiar por eles. Mas, entre si, dispostos a negociar (com os copos de whisky nas mãos) alianças que mais ainda os possam fortalecer. E pior: não são interesses republicanos que dominam a eleição de projetos, porem interesses espúrios e privados objetivando ganhos pessoais.

Quanto à plateia: aplaudindo e pedindo bis.

Abomino, neste sentido, a política.

Seu significado puro – do ponto de vista científico – e seu funcionamento idealizado é diverso e retrata o processo de conciliação da diversidade de interesses.

É preciso “engordar” um terceiro polo, formado por aqueles que respeitam os resultados de eleições, quando perdem ou esquecem em que candidato votou, quando ele ganha.

Permanecer no “apoio incondicional” a um candidato – vitorioso ou perdedor – é a maior tolice da atualidade.

Nenhum apoio pode – nem deve – ser incondicional.

Esta é uma causa direta da tensão social e da livre locupletação dos políticos – entre outras.

Assumo o risco de afirmar – de minha lavra – que uma das grandes besteiras repetida a miúde é de que o eleitor tem que lembrar em quem votou. Nesse discurso, o brasileiro é apontado como culpado por tudo que desanda. Por não saber escolher e por esquecer em quem votou. Diz-se que devemos lembrar para “poder cobrar e exigir”.

Como assim? Se não há canais simplificados para se exigir ou manter diálogo com o eleito. Como assim, se o político depois de empossado se transforma em “autoridade” com todo protetorado garantido pelo conluio de seus pares?

Na verdade, uma das coisas que falta no amadurecimento do eleitor, para que deixe de ser plateia (verdadeiros idiotas úteis) é justamente esquecer em quem votou e passar à postura fiscalizadora do ocupante do cargo. Tenha sido sua ou não, a escolha.

Mas é preciso maturidade para não assumir o que lhe apregoam como supra sumo cidadão.

Acredito e trabalho pelo soerguimento do terceiro polo, cuja postura é a de defender, durante o processo eleitoral, projetos de seu interesse – natural da atividade política – apoiando o candidato que assuma estes projetos para, logo após a expressão do voto, esquecer que nele votou, passando à posição de fiscal, permanecendo alerta para eventuais desvios do projeto inicial ou da postura democrática.

É preciso passar o crivo pessoal, desvinculado de fanatismos, apoiando projetos, ações e pronunciamentos que mereçam aplausos (mesmo vindo de alguém em quem o eleitor não tenha votado) ou abominar projetos, ações e pronunciamentos que não tenham características republicanas (ainda que oriundas daquele que foi seu candidato na ocasião eleitoral). Lembrando que o patrimônio imaterial – cultura e tradição – também são republicanos.

Não sairá da condição de idiota útil aquele que afronta seu grupo mais íntimo para “dar seu tutano para sopa dos outros”, apoiando, sustentando e mantendo políticos eleitos alçados a condição de mito, de herói, de salvador da pátria ou qualquer outro título além do que o diploma político lhe confira.

Mito é narrativa do imaginário que fantasia a convivência entre características de humano com o as de sobrenatural. É alguma coisa ou ser cuja existência não pode ser comprovada.

Herói é alguém que põe em risco a vida em prol de outrem.

Salvador da pátria é título de novela.

Aquele – executivo ou legislador – que promover crescimento econômico e social, apenas terá cumprido seu papel, não lhe sendo permitido implantar qualquer projeto pessoal de transformação das tradições.

Não é herói, não é mito, não é salvador o quê assim proceda.

Mas, enquanto a plateia continuar na postura de luta interna polarizada, servindo a um senhor que desconhece ou que até discorda (ou pior ainda, nem critica, porque não está disposto a analisar), ou de outra sorte perdoando-lhe deslizes e assumindo papel de “apoiador” até naquilo que é odioso, o mundo da política – no que toca sua mais pura definição – está fadado ao insucesso, enquanto que o pleno sucesso será exclusivo dos mandatários da infâmia de seu significado.

Os fanáticos extremos estão herméticos e estacionados nas calotas de seus respectivos polos. Só ouvem aquilo que lhes interessa. Ambos vão apedrejar esta opinião que tenta situar o meio termo.

Mas deve haver pessoas razoáveis dispostas ao diálogo: que não significa “ser vencido”, nem “sintonizar” o polo oposto. Significa ingressar em novo bloco, não belicoso, mas racional e focado na coisa pública, no cargo e suas atribuições. Não na pessoa de seu ocupante.

Significa ser ponte: afirmar-se contra extremos, para servir de passagem. Ou vamos todos ao fundo do abismo.

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